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O valor da multa para estacionamento irregular em calçadas é de R$ 127,53, e 5 pontos na carteira de motorista

Pascoal e Rejane conseguiram criar a filha apesar das dificuldades da cegueira

Foto: Alan Lima

Ir e vir: quem consegue

usufruir desse direito?

 

A Lei assegura que todos. Mas a falta de estrutura adaptada na cidade; e de concientização de parte da sociedade prejudicam quem tem dificuldade para se locomover.

 

 

Por: Alan Lima, Iago Fechine, Jéssica Pinheiro, Louise Mezzedimi e Vitor Lutif

 

Fortalezenses constantemente reclamam da falta de estrutura da cidade. A frota de ônibus parece não ser suficiente já que estão sempre lotados. Os carros estacionados nas calçadas dificultam ainda mais a circulação nos passeios. E o que é difícil para pessoas sem dificuldade de locomoção, fica ainda mais árduo se pensarmos em pessoas com mobilidade reduzida. As calçadas são irregulares, não adaptadas, altas e esburacadas. 

 

Cadeirantes e deficientes visuais são os mais prejudicados já que calçadas são suas únicas formas de deslocamento não motorizado. Atualmente, vivem na capital  2,3 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência, segundo dados do IBGE. É de responsabilidade da prefeitura o investimento em infraestrutura que facilite a locomoção dessas pessoas. 

 

Por outro lado, outros equipamentos são pensados para os deficientes, por exemplo os ônibus que desde 2008 não podem ser fabricados sem elevador de acesso e local preferencial para cadeirantes e cegos no transporte coletivo. Segundo a legislação, o deficiente precisa ter acesso aos espaços públicos, mas de acordo com dados do IBGE, apenas 1,6% das ruas da cidade possuem rampas, sendo o pior índice dentre as capitais de todo o País.

 

Para atender às necessidades específicas de deficientes visuais e cadeirantes é necessária a construção ou implantação de calçadas para a circulação de pedestres, rampas acessíveis, elevação da via para a travessia em nível, e de piso tátil direcional e de alerta, que tem como função orientar o cego através de uma trilha que vai de uma rampa para outra na calçada. Apesar disso, o que temos são equipamentos com os problemas citados no início da matéria.

 

Para os que utilizam cadeiras de rodas ainda faltam muitas melhorias. Os ônibus adaptados ainda são poucos e, quando não estão quebrados, demoram e não possuem os requisitos básicos de segurança, como cinto e fivela. A para-atleta Fah Fonseca precisa ir treinar todos os dias pela manhã utilizando o veículo coletivo, mas aponta dificuldades. “Treino todos os dias pela manhã e vou sempre de ônibus, tenho que saber o horário específico do veículo adaptado, já que são poucos com elevadores”.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Apesar disso, a  Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza (ETUFOR) garantiu que até o final deste ano, pretende atingir a meta de tornar todos os coletivos de Fortaleza acessíveis.

 

Outro ponto negativo apontado pela esportista é a dificuldade em se locomover nos principais pontos e vias de Fortaleza. Fonseca afirma que ir sozinha ao centro da cidade é impossível, pois as calçadas são esburacadas e desniveladas. Sem opção, ela é obrigada a se deslocar pela pista, correndo risco de ser atropelada. 

 

 

Deficientes visuais sentem medo de sair de casa

 

Geralmente, as pessoas acreditam que o deficiente visual é dependente, necessitando sempre de ajuda e até vigilância. Não conseguem perceber as tantas habilidades naturalmente adquiridas pelos cegos, inclusive, para se deslocar no ambiente de forma autônoma e segura. Muitas vezes, o sujeito chega a essa conclusão, porque já se considera inapto ou incapaz quando possui algum problema mais comum na visão como miopia, por exemplo. 

 

Atualmente, a capital cearense tem cerca de 24 mil deficientes visuais. Um deles é Pascoal, que não se deixa intimidar pela cegueira. O massoterapeuta nasceu com uma síndrome chamada retinose pigmentar, conhecida como degeneração da retina. Nasceu enxergando, mas aos poucos foi perdendo a visão e aos 36 anos não via mais nada.

 

Mas para ele, isso nunca foi um problema. Pelo menos no que diz respeito a andar pela cidade. Quando perdeu a visão, resolveu fazer cursos no Instituto dos Cegos. Eram aulas que ensinavam técnicas de massoterapia e de locomoção. “Aprendi várias técnicas quando comecei a me adaptar, no Instituto dos Cegos”, lembra.

 

Atualmente, utiliza os dois aprendizados: é massoterapeuta profissional e tenta se locomover sozinho pela cidade. Tenta, porque nem sempre é possível. As calçadas de Fortaleza raramente são padronizadas. Desde 2008, foram construídas mais de 173 mil metros quadrados de calçadas padronizadas, o que equivale à quase 90km de extensão. O número não surpreende quando lembramos que Fortaleza possui mais de 2,5 milhões de habitantes e área de 314.930 km².

 

Por definição, a calçada é o pavimento construído em frente às edificações, sendo revestido com cimento, lajes ou pedra portuguesa. De acordo com a arquiteta-urbanista, Teresa Cristina, as calçadas são responsáveis pelas articulações necessárias entre qualquer tipo de edificação e as pessoas, contribuindo com a sustentabilidade do sistema de mobilidade urbana, “logo, a acessibilidade é um atributo imprescindível às cidades em que o planejamento é pensado também para o trânsito de pedestres e não apenas de veículos”.

 

É responsabilidade do poder público investir em infra estrutura que facilite a locomoção também dos que possuem essa privação. A construção ou implantação de calçadas para a circulação de pedestres, rebaixamento dos passeios com rampa acessível e instalação de piso tátil direcional e de alerta também é necessário, mas segundo o IBGE, apenas 1,6% das ruas de Fortaleza possuem, pelo menos, as rampas para cadeirantes, sendo o pior índice dentre as capitais do Brasil.

 

Pascoal lamenta a situação da cidade. “Eu acho que o cego não anda mais em Fortaleza por conta das calçadas. Como eu vou para uma praça que é cheia de postes, buracos e degraus? Deveria haver maior investimento nessa área”, argumenta. Para ir de casa até a parada de ônibus mais próxima, Pascoal precisa de ajuda. Além dos problemas já mencionados, há carros que se transformam em barreiras. “Falta fiscalizar mais as calçadas, já que elas são para pedestres, mas carros estacionam e falta conscientização da sociedade”, lamenta.

 

 

Projeto de lei sobre o uso das calçadas

 

Um projeto de lei, de autoria do vereador Iraguassú Teixeira (PDT) está tramitando na Câmara Municipal de Fortaleza desde o começo de 2014. O projeto levanta a discussão sobre o uso das calçadas e pretende garantir a prioridade para a circulação de pessoas e a convivência social.

 

A regra determina que os estabelecimentos comerciais de Fortaleza ficariam proibidos de dificultar e impedir o acesso às calçadas das vias públicas em frente a suas propriedades. Assim se enquadram nas proibições, o uso de cones, correntes, e estacionamentos privativos. Em caso de descumprimento, o Poder Executivo poderá aplicar multa, suspensão do Alvará de funcionamento e até a cassação do Alvará de licença ou de autorização. O projeto encontra-se na Comissão de Legislação, aguardando o parecer do relator sem expectativa de implantação.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Falta de nivelamento do terreno, tem muito lixo nas esquinas e buracos, carros estacionados no meio. Todos os aspectos citados foram percebidos no dia da reportagem.

 

Segundo a Autarquia Municipal de Trânsito, Serviços Públicos e Cidadania (AMC), estacionar em local proibido, nas calçadas e em passeios, é uma das principais infrações cometidas pela população que prejudica a fluidez do tráfego de pessoas e carros. O órgão reforça que com a nova lei, carros que estejam estacionados irregularmente podem ser rebocados e levados ao depósito do Detran. O motorista só terá o veículo de volta após pagar todos os custos relativos ao reboque e à diária no Departamento de Trânsito, além de multa. Estacionar nas calçadas é considerado infração grave, com multa no valor de R$ 127,69 e cinco pontos na carteira.

 

Já dados das secretarias regionais da Prefeitura de Fortaleza mostra que entre os anos de 2013 e 2014, foram registradas mais de 3.500 notificações acerca de problemas no uso das calçadas. A maioria dessas notificações são de imóveis construídos sem respeitar os limites estabelecidos que padronizam as calçadas da cidade ou prédios comerciais que transformam as calçadas em estacionamentos. Ainda de acordo com a prefeitura, após todas essas notificações, mais de 3.000 proprietários de imóveis foram multados.

 

Marcelo Capasso, professor de Arquitetura e Urbanismo da Unifor, destaca que construir sem a aprovação da prefeitura é um dos causadores do crescimento desordenado de Fortaleza que, para o professor, é “uma cidade de puxadinhos”. Capasso aponta também a necessidade da revisão de leis como o Código de Obras e Posturas e a Lei de Uso e Ocupação do Solo, que precisariam incluir o fator humano no planejamento da cidade.

 

 

Sinalização para cegos

 

Rejane é casada com Pascoal e também é cega. Mas nunca teve doença. Foi a violência que a deixou assim. Aos 18 anos, levou um tiro em cada olho em um assalto à joalheria que trabalhava. Após o ocorrido, passou um bom tempo sem sair de casa já que não sabia agir diante do problema. Um ano depois, a jovem foi para uma escola para cegos, instituição que ensina deficientes a ler, aguçar outros sentidos e se locomover. “Depois de um ano que fiquei cega, fui para uma escola atrás da igreja de Santa Luzia. Lá eu fiz a aula de mobilidade, mas não me vi com coragem de andar só”, lamenta.

 

Outro problema enfrentado por ela e por outros cegos é a falta de sinais sonoros para travessia de vias. Segundo a massoterapeuta, Autarquia Municipal de Trânsito, Serviços Públicos e Cidadania (AMC) prometeu que, em 2005, implantaria sinais de trânsito sonoros na capital. Mas, até agora, apenas três operam em condições de uso na Bezerra de Menezes e dentro do Aeroporto Internacional Pinto Martins. Sobre esse assunto a AMC não se pronunciou. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ônibus... Nem pensar

 

Enquanto Pascoal seguia rumo ao Centro da cidade, Rejane o admirava. Na opinião dela, é impossível ser cego e andar de ônibus em Fortaleza, mas mesmo assim o seu marido tenta. Além da falta de conscientização das pessoas no que diz respeito a dar um mínimo de ajuda ao cego em locais públicos (e privados), Rejane fala, a todo momento, das calçadas. E com a nova regra da prefeitura para distanciamento de paradas de ônibus, Rejane rejeita qualquer nova tentativa de independência nesse quesito. 

 

Isso porque a Prefeitura de Fortaleza, apresentou no final do mês de outubro o novo redimensionamento das paradas de ônibus nas vias que receberão faixas exclusivas para o transporte público. A medida faz com que os pontos de paradas tenham uma média de 500 metros entre eles.

 

O projeto prevê várias melhorias, mas acabou não agradando no quesito acessibilidade. Para cadeirantes, pessoas com mobilidade reduzida e portadores de deficiência em geral, as paradas estão muitos distantes uma da outra fazendo o usuário do transporte coletivo ter de se locomover por mais tempo até chegar na estação. Mas segundo o presidente da ETUFOR, Antônio Ferreira, a medida teve que ser tomada visando priorizar o transporte público de forma geral e a diminuição do tempo de viagens dos passageiros. Ele ressalta ainda que nenhum usuário irá andar entre uma parada e outro, mas metade desse percurso. 

 

 

Duas calçadas de Fortaleza
já estiveram entre as dez melhores do país

 

No ano de 2012, as calçadas das avenidas Domingos Olímpio e Bezerra de Menezes já foram consideradas entre as 10 melhores de 12 capitais brasileiras, segundo pesquisa realizada pela ONG de mobilidade sustentável Mobilize Brasil. Com nota média 9,13, ambas estiveram em 8º lugar considerando critérios como existência de rampas, iluminação e presença de obstáculos. 

 

Os pontos analisados pelos usuários foram irregularidades no piso; existência de rampas de acessibilidade; largura mínima de 1,20 m; degraus que dificultam a circulação; iluminação adequada da calçada; sinalização para pedestres e paisagismo para proteção e conforto; e outros obstáculos, como postes, telefones públicos, lixeiras, bancas de ambulantes e de jornais, entulhos.

Fortaleza conta com apenas três semáforos com sinais sonoros para cegos. Foto: Alan Lima

A para-atleta Fah Fonseca conhece de perto as dificuldades que é se deslocar pela cidade, que não é preparada para cadeirantes. Foto: Arquivo pessoal

© 2023 por Coral Feminino. Orgulhosamente criado com Wix.com

Expediente:

Alan Silva Lima, Carla Raquel Juca Carlos, Clarissa Silvino Martins, Douglas Pinto, Iago Fechine Ramos, Iara Maria Sá Lima, Ivina Sales Maciel, Jéssica Malheiros e Silva, Jéssica Pinheiro Vieira, Lise Ane Alves dos Santos, Lívia Holanda De Aguiar,  Louise Pamplona Bede Mezzedimi, Marcella Barreira Argolo Ruchet, Marcella de Lima Pereira, Marília Ceres Costa Felix, Natália Evila Siqueira Rosário, Raphael Ferreira Moura, Samuel Asafe Lima de Siqueira, Sara da Silva de Sousa, Thaysmylly Karen Melo Sousa, Valentina Belen Jara Veliz, Vitor Solano Lutif, Wagner Mendes Crispim, Wilson Lennon Alves Pereira.

Professor orientador: Eduardo Freire

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